2011/02/15

CRIAÇÃO

...onde eu estava mesmo quando a campainha tocou? Deixe-me ver nas anotações. Cavalos mortos, tiros, fumaças, gritos, hum..., acho que isso já foi escrito antes em outro conto, vejamos, vamos continuar procurando. Tenho que encontrar minhas anotações, um dia desses vou ter que começar a me tornar metódico..., mas alguém se torna metódico ou já nasce assim? Se for o caso de nascer assim, vou ter que revirar as outras caixas...

Será que eu estava escrevendo sobre pescaria? Joga linha, puxa linha, torna a jogar e torna a puxa, e peixe que é bom mesmo, neca! Não, esse já está escrito! Tabernas mal-assombradas? Anjos, demônios, apocalipses? Hum...

Mas como é possível acontecer uma coisa dessas?

Num momento estou digitando feito um possesso, a história desenvolvendo-se no monitor, uma página, duas, três, toca a campainha, levanto para atender, procuro pela chave, onde larguei a bendita chave, reviro os bolsos da calça, nada, o bolso do blazer, nada, vou à bolsa, nada, então a encontro sobre o fogão. Não, não quero nem imaginar como ela foi para lá, a campainha continua a tocar, abro a porta, desse canto da sala consigo ver o notebook e a tela, nela o texto.

A campainha toca mais uma vez enfim abro aporta, era uma entrega, assino o recibo, pego o pacote, procuro um lugar na sala onde pô-lo, não acho e deixo em cima do fogão lá na cozinha.

Pronto refiz meus passos.

Mas nada de me lembrar onde deixei as anotações, e olhando para o conto na tela, não consigo achar uma solução para ele.

Continuar como? Como terminar?

Terremoto?

Não, muito usado e mal visto, falta de imaginação de um sujeito que se diz escritor.

Incêndio?

Não!

Já usei esse expediente e mesmo assim depois descobri que o vilão da história não só tinha sido o único a sobreviver, como ainda mudou de nome, cultivou um bigode cafajeste e se meteu num outro conto...

Reler.

Reli e acho que o mundo não perdeu grande coisa mesmo, uma história sem sal, sem pé e nem cabeça, creio até que fui salvo pela campainha, agora até me arrependo de não ter dado uma gorjeta decente pro garoto em vez de uns papeizinhos..., papeizinhos..., papeizinhos...

Corro à janela, mas o entregador já está longe demais...

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